Diego Abreu EM
Manifestantes
favoráveis à aprovação do projeto da Ficha Limpa lavam a rampa do
Congresso Nacional para sensibilizar os parlamentares sobre a proposta
(Ronaldo de Oliveira/CB/D.A Press)
Manifestantes
favoráveis à aprovação do projeto da Ficha Limpa lavam a rampa do
Congresso Nacional para sensibilizar os parlamentares sobre a proposta
Brasília
– A Lei Ficha Limpa vai completar quatro anos em junho e, pela primeira
vez, terá plena efetividade em uma eleição geral. Cercada de polêmicas e
controvérsias quando criada, a legislação representa, agora, a
proibição da candidatura de políticos que tenham sido condenados por
órgão colegiado em processos criminais ou por improbidade
administrativa, e daqueles que renunciaram ao cargo eletivo para escapar
da cassação. Juristas ouvidos pelo Estado de Minas asseguram que não
haverá brecha para os chamados fichas-sujas nas eleições de outubro.
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Fundador
do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), o juiz Márlon
Reis alerta que os partidos e os candidatos que tentarem driblar a
norma, diferentemente de 2010, sairão frustrados das eleições. Há três
anos, dezenas de postulantes a cargos legislativos concorreram em
situação sub judice, quando o registro não é concedido pela Justiça
Eleitoral, mas o candidato insiste em disputar, mesmo sabendo que os
votos poderão não ser contabilizados.
Em
2010, os senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Jader Barbalho
(PMDB-PA) e João Capiberibe (PSB-AP) foram barrados com base na Lei
Ficha Limpa. Nas urnas, os três conquistaram votos suficientes para
serem eleitos, mas não foram diplomados porque os registros das
respectivas candidaturas haviam sido rejeitados. Eles tomaram posse no
ano seguinte, graças a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de
que a legislação não poderia ter sido aplicada naquele pleito, uma vez
que a norma foi criada menos de um ano antes da eleição. O artigo 16 da
Constituição estabelece que as leis que alteram o processo eleitoral só
têm validade um ano depois de entrar em vigor.
Presidente
do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro do STF Marco Aurélio
Mello observa que o Supremo nem sequer chegou a analisar se os políticos
acima mencionados estavam ou não elegíveis. “O Jader Barbalho, por
exemplo, foi salvo pelo gongo, pelo artigo 16. Mas o tribunal não
proclamou a inaplicabilidade da Lei Ficha Limpa. Proclamou apenas que
ela não se aplica às eleições de 2010, mas, a rigor, ele está exercendo o
mandato com a condição de inelegível, porque o Supremo concluiu que a
lei se aplica a atos e a fatos pretéritos”, destacou o magistrado,
lembrando que, em fevereiro de 2012, o STF declarou a
constitucionalidade da lei.
Poucos
aventureiros Márlon Reis considera que neste ano poucos vão se
aventurar a desafiar a Justiça Eleitoral, pois, segundo ele, as chances
de sucesso em um eventual recurso serão praticamente nulas. “Nas
eleições de 2014, a Lei Ficha Limpa vai atingir um grande número de
pessoas. Os fichas-sujas que se candidatarem serão apenas aqueles que
desafiam o sistema, o que é um desserviço que os partidos prestam ao
eleitor e a si próprios. Mas esse número deve ser pequeno, pois a maior
parte dos atingidos são aqueles que nem tentam (se candidatar)”,
sintetizou o juiz, que atua na Comarca de Imperatriz, interior do
Maranhão.
Ele
observou que a Ficha Limpa foi “plenamente aplicada” às eleições
municipais de 2012, mas, na ocasião, ainda havia muitas dúvidas. As
brechas em relação à lei embaralharam o jogo eleitoral e prejudicaram
inúmeros municípios do país, que até hoje enfrentam mudanças na chefia
do Executivo por conta de pendências de candidatos na Justiça Eleitoral.
“Há algumas semanas, foi tirado o mandato do prefeito de Barra do
Garças (MT), em processo ainda relacionado à Lei Ficha Limpa. A culpa é
dele próprio e do partido que indica o nome de um candidato inelegível”,
afirmou. Reis se referiu a Roberto Ângelo Farias (PP), condenado pelo
TSE por abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação
quando candidato a deputado federal nas eleições de 2010.
O
ministro Henrique Neves, do TSE, resume a situação da Lei Ficha Limpa.
“Em 2010, havia uma dúvida sobre a aplicabilidade da lei. No ano
seguinte, o Supremo considerou que ela não seria aplicável, pela regra
da anualidade. A Ficha Limpa já valeu de fato em 2012, mas surgiram
dúvidas por ter sido a primeira vez em que foi aplicada. Já em 2014, ela
se aplicará integralmente sem que pairem dúvidas sobre as hipóteses de
inelegibilidade”, disse.
Contas
rejeitadas Uma das controvérsias da lei que poderá perdurar durante a
campanha de 2014 é a dúvida quanto à aplicação da Ficha Limpa no caso de
gestores que tiveram os balanços de suas administrações rejeitados por
tribunais de contas. O TSE já interpretou que políticos nessa situação
ficam inelegíveis, como também já considerou que somente o Legislativo
tem o poder de rejeitar contas. Segundo Henrique Neves, quando se trata
de contas anuais do governo, o entendimento é de que a palavra final é
do Parlamento, enquanto em relação às contas de convênios basta uma
decisão do Tribunal de Contas.
No
entanto, diante das constantes mudanças na composição do tribunal, há
uma dúvida quanto à interpretação que os ministros do TSE darão ao
trecho da lei que trata da inelegibilidade decorrente da rejeição de
contas. “O que a gente observa é que a jurispridência do TSE ainda é
vacilante sobre alguns entendimentos que se alteraram durante a própria
eleição municipal”, disse a advogada eleitoral Maria Cláudia
Bucchianeri.
Memória
Iniciativa popular
Fruto
de um projeto de iniciativa popular que reuniu mais de 1,6 milhão de
assinaturas, a Lei Ficha Limpa foi sancionada pelo então presidente Luiz
Inácio Lula da Silva em junho de 2010. Poucos dias depois, o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) decidiu que a regra poderia ser aplicada nas
eleições daquele ano. O autor do primeiro recurso contra a legislação
foi o ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz (PSC). O
julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) ficou empatado e acabou
suspenso sem a proclamação de um resultado. Roriz então desistiu de se
candidatar ao governo do DF, indicando a mulher, Weslian, para
concorrer. Somente em março de 2011, após dezenas de candidaturas serem
barradas, o Supremo estabeleceu que a legislação não poderia ter entrado
em vigor no pleito de 2010. Já em 2012, o STF julgou uma ação da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB) que pedia que a regra fosse declarada
válida. Os ministros definiram, por maioria, que a Lei Ficha Limpa é
constitucional e que atinge renúncias ou condenações anteriores à data
em que a norma foi publicada.
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