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sábado, 12 de fevereiro de 2011

Nem renda maior nem Bolsa Família seguram aumento da violência no Nordeste



Por Jamildo Melo

Boa parte da literatura nacional e internacional que trabalha a questão da violência associa a desigualdade e a pobreza como fatores causais fundamentais. Alguns trabalhos importantes apontam para a relação entre a desigualdade e a pobreza com a criminalidade violenta. No entanto, quando o foco da análise é o homicídio na região Nordeste, o resultado não bate com a teoria. O esforço feito pelo governo em áreas sociais não vem respondendo satisfatoriamente na queda da criminalidade violenta na região Nordeste.
"É a contradição nordestina: a violência só cresce no Nordeste, não obstante a melhoria das condições sociais, Bolsa Família incluída e tudo", aponta o pesquisador José Maria Nóbrega Júnior, doutor em ciência política pela Universidade Federa de Pernambuco (UFPE) e professor da Universidade Federal de Campina Grande, no estudo Os Homicídios no Nordeste, elaborado para a revista da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp).

Entre 2001 e 2008 a desigualdade de renda declinou substancialmente no Brasil e de forma contínua, alcançando neste último ano o menor nível das últimas três décadas. Em 2002 era de 32,9% o percentual de pobres em seis regiões metropolitanas do Brasil. Em 2008 esse dado foi de 24,1%, de acordo com a pesquisa mensal de emprego do IBGE. O documento destaca as políticas de distribuição de renda do governo, como as pensões e aposentadorias, o Benefício da Prestação Continuada e o programa Bolsa Família como fundamentais para a queda da desigualdade e melhoria da condição de vida das pessoas. A maior participação relativa (52,99%) dos gastos do Bolsa Família se dá na Região Nordeste.

Em contrapartida, o documento destaca que, apesar do último Mapa da Violência demonstrar que, desde 2003, o Brasil vem reduzindo as suas taxas de mortes por agressão, o que se assiste na realidade é a redução de uma parte do Brasil. "Quando o Estado de São Paulo é retirado do quadro da violência homicida a tendência muda, passa a ser crescente. O Nordeste aparece como a região mais violenta em números absolutos e em taxas por cem mil habitantes", compara.

Na região Sudeste, São Paulo se destaca como caso exitoso na redução dos homicídios. Segundo o estudo, em 1996 foram computadas 12.320 mortes por agressão naquele Estado. Em 2008, depois de anos consecutivos de queda após o início da década, foram 6.126 mortes por homicídio. Em relação ao ano de 1996, a redução de homicídios foi de praticamente 100% em seus números absolutos, enquanto no restante do Brasil os números de morte por agressão são crescentes.

Na Região Nordeste, de acordo com o pesquisador, todos os Estados vem apresentando crescimento deste tipo de violência, com destaque para Alagoas e Bahia que apresentam crescimento explosivo nos últimos anos da série histórica 1996/2008/SIM, analisada no estudo. Pernambuco, Bahia e Alagoas são responsáveis por praticamente 2/3 dos homicídios na região Nordeste, embora a terra de Lula tenha experimentado recuperação desde 2008, a ponto de receber elogios públicos do ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso. Em Alagoas, entre 1996 e 2008, houve 13.673 assassinatos, com uma média de 1.051 mortes por ano. Entre 2001 e 2008 o crescimento percentual foi de quase 130% nos números
absolutos.

A Bahia apresentou uma verdadeira explosão de mortes por agressão entre 1999 e 2008. Em 1999 foram pouco mais de 910 assassinatos, em 2008 este números chegou a mais de 4.700 mortes, igualando ao pior ano de Pernambuco, em 2001, quando houve 4.709 assassinatos. "A Bahia, que teve o maior investimento/gasto do programa Bolsa Família no Nordeste, apresentou um incremento nos números absolutos de homicídios da ordem de 300% entre 2004 e 2007", observa.

Em Pernambuco, depois de três anos de crescimento, em 2008, houve uma queda de 4,6%, com 211 mortes a menos em relação ao ano de 2007. Em 2009, com dados preliminares disponíveis no Datasus, Pernambuco apresentou 3.901 assassinatos, com uma redução percentual de 11,38% em relação ao ano de 2008. José Maria Nóbrega atribui o decréscimo às políticas públicas de segurança adotadas pelo atual governo, com o chamado Pacto pela Vida.

O papel do Ministério Público também recebe um destaque crítico no estudo. Citando como exemplo o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), o pesquisador aponta que, do total de 4.592 assassinatos cometidos no ano de 2007 em Pernambuco, apenas 246 foram denunciados pelo MPPE. O que equivale a 5,4% do total de mortes registradas naquele ano.

"Pouco dos homicídios registrados são investigados e denunciados em Pernambuco, a média de 5,4% comprova isto. Ou seja, 94,6% dos homicídios do Estado não são sequer denunciados ao MPPE. Percebe-se que a atuação das instituições coercitivas se apresenta como fator significante na redução da violência, sobretudo dos homicídios. Os dados apontam para uma associação relevante entre baixa eficácia dessas instituições com os altos índices da violência homicida", observa.

Curiosamente, o próprio aumento do consumo pode estar funcionando como combustível para mais criminalidade. "A melhoria da condição econômica gera mais oportunidades de consumo, inclusive de drogas, e crimes ligados ao patrimônio que podem, também, gerar mais oportunidades de práticas delituosas.

Aumento do efetivo

No estudo, o pesquisador também ataca o mito de que o mero crescimento do efetivo policial reflete na redução da violência homicida. "A princípio parece não haver relação entre o efetivo das polícias e os homicídios na região Nordeste devido à oscilação numérica do efetivo. Percebe-se claramente que, independentemente do crescimento ou decréscimo do efetivo neste período, as mortes por agressão continuam em ascendência", diz. Ele frisa, no entanto, ser essencial a diminuição do déficit policial nos estados nordestinos, sobretudo da Polícia Civil, pois eles tem a responsabilidade de investigar os casos de assassinato, bem como fazer a instrução do inquérito e enviar para o Ministério Público.

Mais prisões e nada

Os aprisionamentos são crescentes no Nordeste, mas os homicídios continuam sendo praticados de forma ascendentes."A presença do Estado na condução da punição da privação de liberdade não está arrefecendo a prática de assassinatos no Nordeste", diz. Só em Pernambuco eram 20 mil presos em 2008. Na Bahia, 14 mil.

Nas suas conclusões, José Maria Nóbrega reclama justamente da negligência do Estado em punir o homicida. Ele diz que não adianta contratar mais policiais sem a devida preparação dos mesmos e sem melhorar a estrutura de trabalho (inclusive salários), bem como a estrutura do sistema de justiça criminal dos estados, com problemas crônicos como déficit de investigação policial, incipiência na condução dos processos, leniência do Judiciário, sucateamento dos sistema carcerário, gargalos fundamentais encontrados na realidade nordestina.

"O papel das instituições coercitivas parece ser o fator determinante para o controle e queda dos homicídios no Nordeste. Falta eficácia nas politicas públicas para que se obtenha realmente o controle dos homicídio na região", afirma.

"Se aquele que comente o homicídio não é preso, seria vantajoso cometer assassinatos, já que a polícia e o sistema de Justiça malogram na inibição deste tipo de crime. A conbinação de parco capital social com alta impunidade afeta o comportamento dos delinquentes. Estes, sabendo que ao cometerem um assassinato terão altas chance de ficarem impunes, e, na hipótese de ser presos, poderem escapar com facilidade dos presídios, não se sentem constrangidos pelas instituições coercitivas", explica.

Municípios

O pesquisador também cobra responsabilidade do municípios na redução da violência homicida. "Apesar de no Brasil as medidas de segurança estar ao encargo dos governos estaduais, é imprescindível o papel dos municípios para o controle da criminalidade homicida. Cidades como Bogotá, Nova Iorque, Diadema, Canoas, Petrolina e outras, conseguiram lograr êxito no controle dos homicídios", diz.

Nos demais Estados

No Ceará, os números de homicídios cresceram, significativamente. Em 1996, os números absolutos cresceram de forma contínua até o final da série histórica, chegando a praticamente dobrar os números em 2008. Em 1996, houve 881 assassinatos e em 2008 esse dado saltou para 1.954, sem nenhum ano de retração.

No Maranhão, em 1996, ocorreu 362 assassinatos, com poucos anos de retração, até se chegar ao patamar de 1.239 mortes desse tipo em 2008.

Rio Grande do Norte teve crescimento de 178%, entre 1996, com 240 assassinatos computados, e 2008, com 669 homicídios catalogados.Na Paraíba, em 1996, ocorreram 636 assassinatos. Em 2008, computou-se 1.027 homicídios.

Alagoas é um estado que mostra redução em seu efetivo policial e crescimento vertiginoso de números absolutos de mortes por agressão. A polícia militar teve um decréscimo de 663 profissionais entre 2003 e 2006. No ano de 2007 computou-se 8.204 policiais militares em Alagoas, ou 820 a mais do que em 2006, o que não foi suficiente para controlar os homicídios. Em 2008, segundo o estudo, Alagoas bateu o recorde de maior taxa entre os Estados da Federação, com 60 homicídios por cem mil habitantes.
Fonte: Blog do Jamildo

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