COMANDANTE GERAL EXONERA COMANDANTE DE BATALHÃO. ENTENDA O CASO.
Coronel Príncipe afirma que não errou ao realizar a ação em Costa Barros.
Operação, que resultou na morte de aluno dentro da sala, gera polêmica dentro da corporação
Rio - Responsável pela operação policial nas favelas da Quitanda e Pedreira, em Costa Barros — onde o menino Wesley Guilber de Andrade, 11 anos, morreu atingido por tiro dentro da sala de aula do Ciep Rubens Gomes, na manhã de sexta-feira — o ex-comandante do 9º BPM (Rocha Miranda), coronel Fernando Príncipe, lamenta a morte dele, mas defende que as operações sejam mantidas: “O Ciep é irrelevante. Se não houver Ciep, haverá uma casa, uma fábrica. Mas o pior é não realizar operações”.
A Delegacia de Homicídios recolheu 35 fuzis de PMs dos batalhões de Rocha Miranda, Barra da Tijuca, Bangu e Santa Cruz, que participaram da ação. As armas serão confrontadas com o projétil calibre 762 encontrado no corpo do menino, compatível com o tipo de fuzil usado por PMs. Policiais civis fizeram perícia ontem no Ciep para calcular de que ponto partiu o tiro.
Wesley foi enterrado na manhã de ontem, no Cemitério de Irajá. No sepultamento, acompanhado por 70 pessoas, amigos da vítima e professores lembraram os momentos de horror. A professora do menino, Mariza Helena, foi a primeira a prestar socorro: “Quando ouvimos os primeiros tiros saímos da sala e nos posicionamos no corredor. Ali era um lugar que considerávamos mais seguro. Mas o tiroteio parou e voltamos para a sala de aula. De repente, ouvimos novos disparos. As crianças começaram a correr para fora, mas uma bala entrou na sala”.
Mariza contou que depois de ser atingido, Wesley ainda correu até o corredor. “Ele caiu no chão do corredor e começou a sangrar. Os coleguinhas gritavam pedindo que não deixasse ele morrer. Tenho 40 anos de magistério, 17 só nesta escola. Mas, depois disso, não sei se conseguirei voltar para a sala de aula”, desabafou.
Diretora da unidade, Rejane Faria passou mal no velório. “Tudo foi embora, todo o nosso trabalho. Me perdoa pai, me perdoa mãe”, lamentou ela no velório, aos prantos. Amanhã, as aulas no Ciep Rubens Gomes estão suspensas. Psicólogos e assistentes sociais da Secretaria Municipal de Educação se reunirão com professores e alunos, que vão vestidos de branco em pedido por paz.
Pai de Wesley, o comerciante Ricardo Freire cobrou a presença de autoridades do estado no último adeus ao filho. “Eles não se preocuparam porque os filhos deles andam de carros blindados e passam longe das áreas de risco”, disparou. O governo estadual arcou com o custo do enterro. “O tudo deles não é nada pra gente”, criticou.
Moradores fizeram manifestação a poucos metros do Ciep Rubens Gomes e da passarela de onde teria sido feito o disparo que matou Wesley
Foto: Severino Silva / Agência O Dia
Governador condena ação e pede desculpas à família
O governador Sérgio Cabral criticou a ação policial e pediu desculpas à família de Wesley: “Só se faz uma operação como aquela, com um Ciep funcionando, se for absolutamente impossível evitar. Não era o caso. É preciso pedir desculpas à esta família. Sou pai de cinco filhos e posso imaginar o que essa mãe, esse pai estão sentindo. A melhor maneira de homenagear o Wesley é continuar a luta pela pacificação.
Muito emocionados, os cerca de 20 funcionários do Ciep Rubens Gomes presentes ao enterro deram as mãos e formaram uma roda após o sepultamento para rezar. “Estamos muito tristes, mas temos que ser fortes. Que Deus conforte o coraçãozinho dos pais deles”, pediu uma professora.
“Nós fizemos tudo, tudo que era possível naquela hora”, disse o professor Felipe Ribeiro, que questionou a demora do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) para o socorro.
Segundo a assessoria de comunicação da Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil, o SAMU registrou uma ligação de socorro para Wesley, às 8h59. De acordo com a secretaria, ela cruzou com o carro que levava o menino para o hospital às 9h10, quando então conduziu a vítima até o Hospital Carlos Chagas, em Marechal Hermes.
Pai impedido de levar corpo para o Recife
Nascido em Olinda (PE), Wesley era filho único de pais separados. “Ele veio de tão longe para virar estatística no Rio”, lamentou o pai, que desejava sepultá-lo em sua cidade natal.
Familiares do menino acusaram funcionários do Instituto Médico-Legal (IML) de não deixarem o corpo permanecer lá enquanto agilizavam a transferência do cadáver para Recife. “Nem no momento de dor somos respeitados.
Cheguei do Recife às 21h de ontem, mas o governo já havia preparado tudo e os responsáveis pelo IML negaram a permanência do corpo sob ameaça de despejo”, revoltou-se Luiz Carlos Freire, 36, tio da vítima.
A Polícia Civil negou que tenha apressado a liberação corpo.
“OU É ASSIM, OU NÃO FAZ”, DEFENDE CORONEL SOBRE OPERAÇÃO POLICIAL EM FAVELAS
Afastado do comando do 9º BPM, o coronel Fernando Príncipe Martins abre fogo contra o comandante-geral da corporação, coronel Mário Sérgio Duarte, em entrevista ao DIA. “Com a minha exoneração, o comandante-geral diz para os outros comandantes que eles devem privilegiar a omissão e a covardia, devem privilegiar o não fazer”. Príncipe diz que não errou e que a perda de vidas inocentes, “eventualmente, vai acontecer”.
OPERAÇÕES EM FAVELAS
"A operação foi necessária. Empresários da Fazenda Botafogo já haviam falado comigo que não aguentavam mais. A ação começou às 8h20, havia 100 homens comandados por um major. Tínhamos como alvos a comunidade de Final Feliz e os morros da Pedreira, Lagartixa e Quitanda. O bandido é inconsequente, faz disparos em qualquer direção. Tivemos que trocar tiros. Não há outro jeito de se fazer operação. Ou é assim ou, então, não faz. A Inteligência diz que o bandido ele está lá dentro (da favela). Temos que ir lá. O que a polícia deve fazer? Não fazer nada é prevaricação. O delegado Alzir (Roberto Alzir Dias Chaves, Superintendente de Planejamento Operacional da Secretaria de Segurança) me ligou e cumprimentou pela operação.Você não tem como alvo o Ciep.
MORTE DE WESLEY
"Eu lamento muito, claro. Mas não fui responsável por ela, meus policiais também não. Com a minha exoneração, o comando mostra que não assume a responsabilidade de seus comandados. Não foi a primeira vez que um estudante foi atingido naquele Ciep e o poder público nunca providenciou a blindagem do prédio. Estive no local, vi o que poderia ser feito. Abomino a morte de inocentes, mas isso, eventualmente, vai acontecer.”
TRABALHO NO 9º BPM
O 9º Batalhão, quando eu o assumi, era inoperante. Um batalhão de guerra não pode ter dois blindados baixados (fora de condições de uso), 40 fuzis inservíveis. Começamos a entrar em território em que a PM não ia. Claro que, nesses locais iríamos encontrar delinquentes bem armados. Mas era preciso fazer. Na semana passada, delinquentes da região atacaram uma cabine da PM e mataram um taxista."
EXONERAÇÃO
"Lamento que o comandante-geral tenha me exonerado antes de me ouvir. Ele tem a função de apoiar seus comandados e de ser justo. Foi como se ele dissesse que não importa se houve erro ou acerto, não importa quem tem razão, o que não pode é colocar em risco sua função. Depois da minha exoneração, como oficiais e praças vão agir? Terão segurança para pegar suas asmas sabendo que poderão ser exonerados? Pior é a desmoralização de um servidor público. Há 2 meses, ele (o comandante-geral) me apresentou um quadro crítico no 9º BPM; agora, ao me exonerar, ele diz para a sociedade que o oficial não é competente.
INDUZIDO AO ERRO
"Nunca houve orientação do comandante-geral para que eu não fizesse este tipo de operação. Ao me exonerar, me disse que sua política privilegiava as UPPs. Eu então afirmei que ele havia me induzido ao erro, não havia sido firme em sua orientação. Ao contrário: ao me empossar no 9º BPM, ele fez um discurso na linha do combate. Afinal, trata-se de uma área onde há 100 favelas. O comandante-geral não foi injusto comigo pessoa física, foi com os os comandantes de batalhão.”
FUTURO NA PM
“Sob este comando, meu futuro na PM não deverá existir. Fui desmoralizado por um erro que não houve. Não acho que tenha condições de assumir novas funções”.
Por Diego Barreto, Fernando Molica e Thiago Feres
Fonte: http://odia.terra.com.br/
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