O GLOBO
Déficit
previdenciário dos estados pode crescer 57% até 2020
Sem mudança de
regras, rombo pode chegar a R$ 101 bilhões
Geralda Doca
- Andréa Machado/Agência O Globo
BRASÍLIA - Os estados pediram ao
governo federal para serem incluídos na reforma da Previdência, a fim de
desarmar uma bomba que pode explodir em quatro anos. Sem mudança nas regras
para servidores públicos, o déficit dos regimes próprios estaduais, que alcançou
R$ 64,266 bilhões no ano passado, chegará a R$ 101,144 bilhões em 2020 — um
aumento de 57,4% no período, de acordo com cálculos de um estudo contratado por
um grupo de governadores, que inclui Rio e São Paulo. A cifra indica quanto os
estados terão que aportar a mais para pagar aposentados e pensionistas, já
descontadas as receitas com contribuições.
INFOGRÁFICO: Uma ameaça de R$ 101 bilhões
Diante do problema, governadores
reunidos em Brasília na semana passada concluíram que a reforma da Previdência
é crucial para vencer a crise fiscal que abate os estados e decidiram defender
conjuntamente medidas para reduzir o peso das despesas com benefícios. Além do
aumento da contribuição, eles querem que a União acabe com os regimes especiais
de policiais militares e bombeiros — que representam quase um quarto do gasto
com servidores estaduais inativos. De um custo total de R$ 127,6 bilhões em
2015, a categoria respondeu por R$ 28,8 bilhões. A previsão é chegar a R$ 32,2
bilhões neste ano.
O levantamento sobre a projeção de
déficit dos regimes próprios de Previdência dos estados foi feito pelo
consultor da comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados, Leonardo Rolim.
Segundo o estudo, o déficit dos regime próprios de previdências estaduais — que
consumiu 11,7% das receitas correntes líquidas dos estados em 2015, chegará a
17% em 2020, se nada for feito. Rolim está assessorando um grupo de
governadores, como Rio, São Paulo, Santa Catarina, Distrito Federal, que estão
à frente da mobilização e que conta inclusive com o apoio de Minas Gerais e do
Piauí, comandados pelo PT.
EXPECTATIVA DE MUDAR REGRA PARA
PROFESSORES
Eles querem que as mudanças venham de
cima para baixo, na Constituição ou em lei federal, e não em negociações com as
assembleias legislativas. A elevação gradual das alíquotas de contribuição dos
servidores de 11% para 14%, inclusive para a União, poderá ser feita via
projeto de lei, com aplicação automática nos estados.
No caso do fim dos regimes especiais
para policiais e bombeiros, basta o governo federal fixar na Proposta de Emenda
Constitucional (PEC), a ser enviada ao Congresso, idade mínima para a
aposentadoria, que exige atualmente apenas tempo de contribuição. O tema é de
competência dos estados, que afirmam não ter força política suficiente para
mudar as regras nas assembleias.
Os governadores também têm expectativa
de que a PEC vá alterar as regras para os professores, que podem se aposentar
na frente dos demais. Segurança e educação são duas rubricas que exercem forte
pressão nas contas de estados e municípios. Eles querem que o governo federal
dê foco à previdência dos servidores públicos e não apenas ao regime geral
(INSS).
O assunto será levado ao presidente
Michel Temer pelos 27 governadores, assim que ele retornar da viagem à Índia e
ao Japão, na próxima sexta-feira. Também vão participar da reunião os
presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
O governador licenciado do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), é um dos
coordenadores do movimento.
— Os 27 entes da federação querem a
reforma da Previdência. Fazer parte da PEC (Proposta de Emenda Constitucional)
dá segurança jurídica — disse ao GLOBO o governador Pezão, acrescentando que,
além das barreiras na Justiça ao aumento de contribuição de servidores, há
resistências nas assembleias para mexer com as aposentadorias especiais.
O governador do Distrito Federal,
Rodrigo Rollemberg (PSB), justificou o interesse do grupo:
— Todos os estados, sem exceção, têm
uma previdência deficitária. Por isso, os governadores estão se unindo para
ganhar reforço e angariar apoio do Congresso Nacional. Isso vai facilitar para
todos.
Segundo Pezão, o aumento da
contribuição previdenciária dará um alívio de caixa mais imediato, de cerca de
R$ 500 milhões por ano, no caso do Rio. O fim dos regimes especiais, explicou,
vai levar algum tempo para surtir efeito, porque é preciso uma fase de
transição em função de direitos adquiridos. Ele destacou, entretanto, que esta
medida é fundamental para o Estado, pois 66% das despesas com Previdência são
com aposentadorias especiais.
— Para cada cem policiais da ativa, há
600 aposentados. Muitos se aposentam aos 49 anos, recebendo salários acima de
R$ 20 mil. Se a economia não crescer, esse sistema não fica de pé — disse
Pezão, que defende um maior tempo desses profissionais na ativa.
O governador destacou ainda que o
estado vem fazendo cortes, inclusive com possibilidade de demissão de
servidores ativos, sacrificando áreas essenciais como saúde e educação. Para
ele, chegou a hora de os inativos darem a sua contribuição.
Segundo o estudo, o Rio teve uma
despesa total com inativos de R$ 13,769 bilhões no ano passado, sendo que R$
3,186 bilhões foram destinados ao pagamento de benefícios a policiais e
bombeiros. A projeção de gasto com a categoria neste ano é de R$ 4,113 bilhões
de um dispêndio total de R$ 18 bilhões. Em São Paulo, o gasto com policiais aposentados
foi de R$ 7,381 bilhões de um valor total de R$ 28 bilhões. Em Minas Gerais, a
categoria respondeu por R$ 5,799 bilhões de um dispêndio total de R$ 17,457
bilhões.
O déficit previdenciário do Rio, que
foi de R$ 6,357 bilhões em 2015 (o que comprometeu 12,41% das receitas
correntes liquidas), está estimado em R$ 8,713 bilhões neste ano, saltando para
R$ 10,632 bilhões em 2020. No Rio Grande do Sul, que registrou déficit de R$
7,595 bihões no ano passado, o rombo do regime de Previdência correspondeu a
25,2% das receitas líquidas do estado.
No conjunto dos estados e Distrito
Federal, há 1,442 milhão de servidores aposentados e outros 490.215
pensionistas para um total de 2,678 milhões de trabalhadores ativos. A
proporção entre ativos e inativos, que está em 1,4, vai cair ainda mais, disse
o autor do estudo. Ele lembrou que a criação de fundos de previdência
complementar para os novos, medida que já vem sendo adotada, é importante, mas
só terá efeito no caixas estaduais daqui a mais de duas décadas. Neste caso, o
valor do benefício é limitado ao teto do INSS e o restante é complementado em
regime de capitalização.
— O problema são os servidores mais
antigos. É preciso resolver esse passivo — destacou Rolim, que defende o
funcionamento efetivo dos fundos previdenciários, com aporte de recursos
adicionais, como por exemplo, da securitização de débitos inscritos na dívida
ativa, projeto que está em tramitação no Congresso.
Segundo uma fonte do governo que está
participando das discussões da reforma, a proposta que está nas mãos do
presidente prevê a convergência de regras para todos os regimes e, por isso, o
impacto das mudanças será maior para os estados do que para a União.
— Como se propõe a convergência de
regras, os ganhos fiscais da reforma para os estados devem ser mais
substanciais que na União, em função do peso de segurança e educação — disse um
auxiliar do presidente.
Entre as mudanças sugeridas estão a
fixação de idade mínima de 65 anos para todos os trabalhadores que requererem
aposentadoria, extinção gradual das diferenças de regras entre homens e
mulheres e professores, alteração na pensão (redução do valor e fim do
beneficio vitalício), proibição de acúmulo de aposentadoria e pensão, entre
outros. O alcance da reforma, no entanto, ainda será definido por Temer, depois
de conversar com as partes envolvidas.
‘NÃO CABE MAIS NA FOLHA DOS ESTADOS'
Por isso, a iniciativa dos governadores
faz toda diferença, avalia o economista Raul Velloso, especialista em contas
públicas, que também está assessorando os governadores:
— Ao incluir os governadores na
reforma, você mata vários coelhos de uma cajadada só.
Para o pesquisador do Instituto Ibre da
Fundação Getulio Vargas (FGV) José Roberto Afonso, o problema da Previdência
impõe a necessidade de mostrar as contas para toda a sociedade, com a
realização de um debate técnico. Ele destacou que as medidas exigem coragem dos
governadores, com coordenação e suporte do governo federal, do Congresso
Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF).
— Não cabe mais nas contas dos estados
a folha dos salários de quem está em serviços públicos essenciais, como
segurança, ensino e saúde, e também a folha de aposentadorias e pensões, até
porque o seu número já supera o de ativos nos governos em maior crise. Quanto
mais se adiar o enfrentamento dessa questão, mais se abreviará a desorganização
de serviços básicos e a intervenção federal se fará inevitável — alertou o
pesquisador.
Caso o governo acate o pleito dos
governadores, eliminando as aposentadorias especiais para policiais militares e
bombeiros, ficará difícil deixar de fora da reforma as Forças Armadas, avaliou
um interlocutor. Entre as propostas colocadas à mesa para os militares, estão
elevar o tempo na ativa de 30 anos para 35 anos e subir o valor das
contribuições, atualmente em 7,5% e 1,5% adicional para os militares que
decidiram manter a pensão das filhas.
Segundo dados do governo federal, o
déficit da Previdência dos servidores da União atingiu R$ 35,5 bilhões em 2015
e o dos militares das Forças Armadas, R$ 32,5 bilhões. No INSS, o rombo foi de
R$ 85 bilhões.
Postado por Adeilton9599
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