O Pacto que pede reforma - Jornal do Commercio (Política)
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Mariana Araújo
Pernambuco
é conhecido como um dos Estados mais violentos do Brasil. Para
enfrentar o problema, em 2007 foi criado o Pacto Pela Vida, programa que
reduziu os homicídios, mas que, na avaliação de especialistas, precisa
ser revisto. Paralelo a isso, o sistema penitenciário está esgotado.
Levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça apontou o complexo
do Curado como o pior presídio do País. Cerca de 80% dos detentos,
quando são libertos, voltam a praticar crimes, retornando para o sistema
prisional.
Criado
em 2007, o Pacto Pela Vida, o programa de combate à violência elaborado
pelo governo de Eduardo Campos, tinha como meta reduzir os índices de
assassinatos em Pernambuco em 12% ao ano. Analisando os dados ano a ano,
verifica-se que o número de homicídios reduziu, mas a meta não foi
alcançada. E em 2014 pode-se registrar o primeiro crescimento após seis
anos consecutivos de redução. No primeiro semestre, foram contabilizados
1.752 assassinatos, contra 1.600 no mesmo período do ano passado. Os dados constam no site da Secretaria de Defesa Social (confira na arte).
Para
o professor de ciências políticas da Universidade Federal de Campina
Grande, José Maria Nóbrega, ainda é cedo para analisar as causas que
levaram ao incremento nos homicídios, mas ele aponta duas
possibilidades. "O
ex-governador Eduardo Campos saiu de cena, deixou o governo para se
preocupar com a sua imagem nacional. E também o desgaste da política
pública. Pode ser que o programa não esteja sendo acompanhado ou, se
estiver, esse acompanhamento não está sendo feito da maneira adequada",
explicou. Eduardo era conhecido pela sua "mão de ferro" na condução do Pacto Pela Vida, com altos níveis de cobrança aos envolvidos.
Nóbrega citou que a troca de gestores do programa já interferiram uma vez nos números. "Quando foi criado, o Pacto era coordenado por João Lyra. E o primeiro ano fechou sem alcançar a meta de redução de homicídios, que era de 12%. Então, Eduardo colocou o programa na Secretaria de Planejamento, que estava com Geraldo Julio (PSB), atual prefeito do Recife, quando o número voltou a ser favorável",
explicou. Por coincidência, os números do Pacto voltaram a crescer no
último semestre a partir de março, quando Eduardo despediu-se do
governo, e seguiu até junho, na gestão de Lyra
Além
da redução de homicídios, o Pacto Pela Vida lançou também outras metas,
como o número de inquéritos que devem ser concluídos pela Polícia
Civil. Citando dados do Ifopen, sistema de contagem da população
carcerária do Ministério da Justiça, Nóbrega afirma que as prisões por
homicídios qualificados cresceu 111% entre 2006 e 2011. No mesmo
período, as prisões por homicídios simples foram ampliadas em 851%. Os
números, apesar de positivos, geraram outro problema - o inchaço no já
superlotado sistema prisional do Estado.
Mas
esse incremento no número de prisões não significa que os inquéritos
estão encerrados com celeridade e qualidade. "Com o prazo curto para
fechar, os inquéritos estão perdendo em qualidade. O Ministério Público
está devolvendo, pedindo mais diligências", relatou o presidente do
Sindicato dos Policiais Civis de Pernambuco (Sinpol-PE), Claudio
Marinho.
Pernambuco
tem hoje 5,6 mil agentes de polícia, mesmo efetivo de 2006. Segundo o
Sinpol, entre 2007 e 2014, 38% pediu exoneração. O
salário base da categoria é de R$ 3,6 mil. Marinho acredita que o
número atual de agentes é suficiente, mas há uma má distribuição do
efetivo.
INTERIOR
Se
na capital assusta o crescimento do número de assassinatos, no interior
os assaltos tiram a paz das cidades. Alguns deles terminam de forma
trágica, como o que aconteceu em 2 de outubro do ano passado, em Bom
Conselho (Agreste). Dois homens assaltaram a agência dos Correios e, na
fuga, tomaram a professora Alexandra Machado Ferreira, 33 anos, e uma
criança de um ano como reféns. A professora foi encontrada morta, no seu
carro, com um tiro no peito. A criança nada sofreu.
A irmã de Alexandra, Jeanne Machado Cavalcante, 39 anos, credita a morte ao despreparo da polícia. "Mesmo que tivessem cinco bandidos no carro, os tiros não deveriam ser fatais", desabafa.
O
caso não foi solucionado. A Polícia Federal não concluiu se o tiro que
atingiu a professora partiu da Polícia Militar, que perseguiu os
assaltantes, ou dos bandidos. Dos dois, apenas um está preso. Haveria
indícios que o segundo foi assassinado, mas a PF não confirma.
(conteúdo vinculado)
O nó do sistema penitenciário
O
Pacto Pela Vida conseguiu ampliar o número de prisões, mas o sistema
penitenciário não acompanhou esse crescimento. As penitenciárias,
presídios e cadeias públicas, que já eram superlotadas, passaram a
receber mais gente. Hoje, o principal problema enfrentado nas unidades é
a superlotação, que gera outros imbróglios como falta de assistência
social. Segundo dados da Secretaria Executiva de Ressocialização
(Seres), há em Pernambuco 30,3 mil presos, quando a capacidade do
sistema é de 10.978 vagas em 20 unidades.
No
final do ano passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizou uma
vistoria em presídios de todo o País. O Complexo do Curado, antigo
presídio Aníbal Bruno que foi desmembrado em três unidades, foi
considerado o pior presídio do Brasil. Foram apontadas 17 recomendações
que têm como objetivo dar mais celeridade ao sistema. Entre elas, a
melhoria do sistema de informática e a distribuição dos processos entre
as quatro varas de Execução Penal.
"Há
uma cobrança social pelo fim da violência e o culto à política do
encarceramento. O princípio da ressocialização é uma utopia. Não há
possibilidade de ressocialização nas nossas penitenciárias" , avaliou o
presidente da OAB-PE, Pedro Henrique Reynaldo Alves. "Mas o Estado
sozinho não vai dar conta, precisa da ajuda do Poder Judiciário, do
Ministério Público, da advocacia", completou.
Pelo
que constatou nas visitas aos presídios, Pedro Henrique afirma que as
unidades sobrevivem com um código de conduta próprio. "O Estado, por não
atuar de forma competente, vive refém das circunstâncias dos criminosos
e facções", disse. Entre essas circunstâncias, estão a permissão para a
prática do comércio dentro dos presídios e a entrada de objetos como
ventiladores e televisores, sem falar no tráfico de drogas. "Há uma
conivência do Estado. É um pacto silencioso para se manter no controle",
denunciou.
A
superlotação é principal causa da não ressocialização do detendo,
aponta o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários (Sindasp),
Nivaldo de Oliveira Júnior. "Pernambuco tem uma reincidência de 80%. Os
outros órgãos prendem, mas o sistema prisional não cumpre o seu papel,
que é de ressocializar. Ninguém considerou o sistema penitenciário com
providência. O Estado criou um armazém, colocou lá dentro como um bicho e
disse para o agente: � te vira�", afirmou.
A
falta de pessoal também é uma crítica. Hoje, são 1,5 mil agentes para
todos os presídios. O Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária determina que um agente deve atender cinco presos. Ou
seja, Pernambuco deveria ter pelo menos 6 mil agentes. Um exemplo da
falta de pessoal é refletida na presença dos chaveiros.
"Não
se pode falar em segurança pública sem falar no sistema penitenciário.
As pessoas que estão encarceradas irão retornar às ruas. A reincidência é
o resultado do tratamento indigno" , avaliou o promotor de Execuções
Penais da Capital, Marcellus Ugiette. "É preciso criar uma política
pública de Estado para o sistema carcerário no âmbito nacional. Mesmo
com a superpopulação, deveria se separar o preso primário do
reincidente, o que praticou um crime menor do mais perigoso", sugeriu o
promotor. Ugiette atuou numa comissão formada no Senado para rever a lei de Execucoes Penais, que completou 30 anos em julho. O texto está em tramitação no Congresso.
Para
o professor de Direito Penal da Universidade Católica de Pernambuco
(Unicap), Alexandre Nunes, a ressocialização pode começar com a
capacitação profissional. "É preciso olhar para as grandes demandas do
mercado. Os cursos do Pronatec poderiam ser aplicados nas cadeias, assim
como as parcerias com o Sesc, Senat", sugeriu. Atualmente os presos
participam de atividades profissionais é de 15% e 25% estudam nas
unidades prisionais.
Marcellus
Ugiette sugere mais. "Deveria haver uma lei em que as empresas que
mantém parcerias para empregar dentro dos presídios garantisse também
postos de trabalho para esses detentos quando eles saíssem", explicou.
Funase a base de temporários
Se
no sistema penitenciário para detentos na maioridade a situação é
considerada caótica, na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase),
destinada a adolescentes de 12 a 18 anos, não é diferente. São 24
unidades que abrigam 1.626 jovens, quando a capacidade é de 1.025,
segundo dados da Funase. As situações mais complicadas são as unidades
do Cabo (209 internos onde só cabem 98) e Abreu e Lima (capacidade de
166 e atendimento a 414). Os problemas não param na superlotação.
Atingem também a falta de ressocialização. E isso se reflete em
violência. Desde o ano passado, 13 jovens foram assassinados dentro das
unidades.
"A
superlotação gera o desconforto e insatisfação. O excesso de
adolescentes causa temor de rebelião e leva à prática de violência",
analisou o promotor da Infância do Cabo, Allison Carvalho.
O
promotor confirma que há projetos de educação e atividades artísticas e
culturais, mas há poucos de caráter profissionalizante. "Também falta
um atendimento na saída desse jovem da unidade. Ele é entregue à
sociedade e não tem um acompanhamento externo. Ele entra num sistema sem
infraestrutura e quando sai, não tem perspectivas. Isso faz com que os
adolescentes voltem a praticar atos infracionais", acrescentou Carvalho.
A
falta de ressocialização dos adolescentes, aponta o promotor, é fruto
da falta de políticas voltadas para o adolescentes infratores dentro das
unidades. Não há concurso público para os agentes socioeducativos. O
fato é comprovado pelo agente Airton Pessoa da Silva, que atua no Cabo.
São cerca de 1,5 mil agentes. "Todos os contratos são temporários, com
vínculo precário e direitos negados, como risco de vida e adicional
noturno", disse Carvalho.
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- Tópicos de legislação citada no texto
Lei nº 7.210 de 11 de Julho de 1984
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