Nem sempre é a base da pirâmide que se mostra insatisfeita
publicamente para implementar mudanças sociais e políticas. No Brasil, e
particularmente considerando o contexto militar, vivemos o célebre movimento tenentista,
que mesmo não tendo sido protagonizado pelas altas patentes das Forças
Armadas, também não pode ser considerado “da base”, como é o caso de
greves, revoltas e motins liderados e encorpados pelas praças. No Rio de
Janeiro contemporâneo, mais especificamente em 2007, tivemos o
movimento dos “Coronéis Barbonos”, que chegaram a publicar a “Carta dos Barbonos“,
com reivindicações incisivas à administração da segurança pública no
Governo do Estado (já sob gestão de Sérgio Cabral e José Mariano
Beltrame).
Como se sabe, os Barbonos cariocas foram dissolvidos (pelo menos não
se ouve mais falar deles), e suas reivindicações não foram atendidas:
entre elas, a implementação de uma “política salarial calcada na
integração remuneratória entre as forças policiais do Rio de Janeiro”.
Curiosamente, a Polícia Militar do Estado de São Paulo vive movimento
similar, onde se sabe que boa parte dos coronéis PM estão insatisfeitos com a disparidade remuneratória que os Delegados da Polícia Civil acabaram de conquistar do Governo.
O mérito da questão é resolvido sem pestanejar: é óbvio que os governos, ao criar disparidades entre duas categorias historicamente rivais,
põe combustível em uma fogueira em plena atividade. Principalmente no
caso de São Paulo, que vinha mantendo um alinhamento pouco visto no
Brasil – geralmente os governadores reconhecem a existência de
disparidades salariais alegando o efetivo menor das polícias civis,
favorecendo, assim, o incremento dos vencimento destes.
“Nenhum oficial PM chega ao último posto sem alianças políticas, e nos últimos anos não houve outra possibilidade em São Paulo, senão estar politicamente alinhado com os governos ‘psdbistas’”
Mesmo com essa questão crucial em jogo, vale refletir sobre o
contexto em que um levante político tão incisivo ocorre nas altas
patentes da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Ora, num estado
comandado pelo mesmo grupo político desde a década de 90 – o PSDB está
assumiu o governo em 1995 – é de se estranhar tamanha oposição, frontal e
declarada. Vale lembrar que nenhum oficial PM chega ao último posto sem
alianças políticas, e nos últimos anos não houve outra possibilidade em
São Paulo, senão estar politicamente alinhado com os governos
“psdbistas”.
Para quem gosta de teorias da conspiração, aí vai uma que circula nos bastidores do “movimento coronelista”…
Kassab, candidato a governador
É sabido por todos que o ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, é pré-candidato ao Governo do Estado de São Paulo. Também sabe-se de sua aproximação com integrantes do escalão superior da PMESP, já que durante sua gestão nomeou mais de 20 coronéis PM da reserva remunerada
para subprefeituras, fazendo com que os vencimentos dos oficiais
aumentassem significativamente. Pautados nessas duas informações, muitos
se perguntam: até que ponto o furor da atual mobilização é tributada à
disparidade salarial que o Governador Geraldo Alckmin está permitindo?
Ou será que deve-se fazer a consideração ao contrário? Até que ponto a
disparidade salarial permitida pelo Governador Geraldo Alckmin estão
pautadas nessas duas informações?
Leia na Revista Fórum: “Infográfico explica quem são os coronéis no comando de São Paulo”
Greve na PMESP
Políticos representantes da categoria e cerca de 19 associações de
classe falam claramente em greve, ecoando o que a imprensa vem tratando
como vontade dos coronéis insatisfeitos. Nesta terça, a previsão é que policiais militares se concentrem em frente ao Palácio dos Bandeirantes, reivindicando a paridade entre os salários da Polícia Militar e da Polícia Civil, e a revisão dos salários da categoria.
A última greve realizada por policiais militares em São Paulo foi
bastante traumática, em 1988, havendo confronto com as Forças Armadas e
dezenas de demitidos:
“O rádio de comunicação dos carros foi o modo usado pelos policiais revoltados para paralisar o patrulhamento das ruas na região central de São Paulo. Por aumento de salário, os PMs cruzaram os braços em 19 de fevereiro de 1988, no maior motim enfrentado pela corporação desde o levante dos bombeiros, em 1961. Os homens do 7º Batalhão se reuniram na Praça da Sé e acabaram dispersados pela tropa comandada pelo então coronel Ubiratan Guimarães, que mais tarde comandaria a invasão do Pavilhão 9 da Casa de Detenção, quando 111 presos morreram.
A reação do comando foi enérgica. Dois Inquéritos Policiais Militares (IPMs) foram abertos – um na capital e outro no interior. Ao todo, 460 PMs foram indiciados por participação ou omissão na greve. A PM expulsou 3 e demitiu 157 homens. / M.G.”
Fonte: Estadão
Neste momento, os policiais militares paulistas estão claramente
divididos entre as insatisfações que possuem (principalmente salarial) e
o receio de servirem como “bucha de canhão”, caindo no papel de
marionetes de um jogo de poder que pode ir muito além da mera
reivindicação da categoria. Manter-se silenciosamente insatisfeito ou se
manifestar arriscando a pele? Veremos o que os policiais militares,
para além dos coronéis, irão escolher.
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