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quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pelo que entendi, o direito dos mascarados não pode prevalecer sobre o interesse coletivo de manter incólume a ordem pública.

opinião

Os mascarados e as manifestações populares


Por José Vladimir Acioli, presidente da Associação do Ministério Público de Pernambuco (AMPPE)

As manifestações de rua, que exaltam a insatisfação popular com temas que há décadas esperam por políticas públicas, caíram no gosto da sociedade.

Mesmo com os transtornos que têm trazido ao cidadão que apenas quer chegar ao seu local de trabalho e dar conta dos seus compromissos cotidianos, percebe-se que a sociedade em geral se mostra tolerante com os manifestantes e apoia as suas justas reivindicações.

O caldo entorna quando a manifestação pacífica, justa, democrática, fruto do direito fundamental da livre expressão esbarra em atos de vandalismo que põem em risco a ordem pública. Atos que depredam o patrimônio público e privado,colocam em xeque a ação das autoridades, causam danos ao transporte público e à segurança das pessoas.

Mostra-se evidente pelas imagens que ilustram as reportagens da mídia que esses atos não são perpetrados pelo cidadão de boa fé que comparece às manifestações para exercer um ato de civismo, expor de forma mais clara a sua insatisfação com algum tema que o afete diretamente.

Bem ao contrário, seus autores são hordas de mascarados que ali estão com um único propósito: praticar atos de vandalismo, dar vazão às suas frustrações mediante destruição de ícones, que talvez até tenham sua parcela de contribuição nas insatisfações populares de todos conhecidas, mas que, constituindo-se em bens públicos e privados, merecem a tutela da Lei, devem ser protegidos.

Assiste-se então a um impasse injustificável, com ares de polêmica que apenas serve para semear o desencontro entre as instituições e dúvidas no cidadão. A Polícia Judiciária defende a repressão pura e simples aos mascarados; enquanto o Ministério Público, acertadamente, aponta que o uso de máscara em local público não constitui crime.

Não se pode coibir a manifestação pública da população. Mas a leniência para com os atos de depredação, vandalismo e prática de crimes de dano ao patrimônio público e privado não pode ser justificada, pois tais atos devem ser coibidos com rigor suficiente pelo Poder Público, sob pena da prática de crime de prevaricação por parte do agente público com atribuição para atuar naquelas situações.

A fim de trazer alguma contribuição ao debate, tenho por equivocado o foco da polêmica estabelecida. Persiste-se no grave equívoco da busca da “criminalização” dos movimentos sociais. O Código Penal, que tipifica previamente as condutas tidas como crime, não se presta ao enfrentamento inicial da grave situação apresentada. A atuação do Poder Público deve ser preventiva, garantindo a realização da manifestação da sociedade, mas procurando evitar a prática de atos de vandalismo. Como atuar dessa forma sem lançar mão da repressão pura e simples?

Penso que uma saída possível é o exercício do poder de polícia administrativa, que não se confunde com o caráter exclusivamente repressivo da polícia judiciária. O exercício da polícia administrativa tem como um de suas características a auto-executoriedade, que vem a ser a possibilidade de compelir materialmente o administrado a obedecer determinada conduta, que na hipótese seria a exigência de identificação de pessoa ou grupos de mascarados, bem como condicionar a participação dos mesmos na manifestação sem o uso do adereço.

Mas aí, poderia se perguntar: como exigir esse comportamento quando uma lei anterior não o impõe? Seria a defesa do princípio da anterioridade da lei.

Ocorre que a exigência apontada não está inserida na órbita penal. Cuida-se de providência administrativa justificada pela urgência, caracterizada pela prática anterior de atos graves que abalaram a ordem pública e que trazem um sinal distintivo bem claro, que é o fato de serem perpetrados por agentes mascarados que se infiltram na multidão com o fim específico de cometer crimes e outros atos de vandalismo que causam prejuízos ao patrimônio público e de terceiros.

Deve ser dito que o exercício do poder de polícia administrativa é coercitivo, ou seja, tem o poder de se impor em face da negativa do administrado em obedecer ao comando expresso. Ora, não aceitando se identificar, bem assim retirar a máscara, o administrado pode ser compelido a se retirar da manifestação. A recalcitrância pode vir a dar ensejo à prática do crime de desobediência ou mesmo de desacato, caso a recusa ensejar ofensa ou desprestígio à função pública do agente responsável pela abordagem.

É preciso ter em mente a lição do filósofo Noberto Bobbio quando afirmava que não existem direitos fundamentais absolutos. O exercício do direito fundamental por um indivíduo pode esbarrar, e isso acontece com frequência, em outro direito igualmente fundamental de terceiro. Restaria estabelecida uma colisão de direitos fundamentais com sujeitos diversos. A solução se impõe pela ponderação dos direitos em conflitos, a fim de que prevaleça o que esteja em maior consonância com o interesse público.

Na hipótese tratada, a colisão entre o direito à livre manifestação e a segurança ao patrimônio público e de terceiro, bem assim à segurança individual do cidadão, impõe que se preserve a livre manifestação da população, mas que se coíba a participação de terceiros que estão visivelmente mal intencionados, especialmente quando em grupos usam máscaras e promovem atos de vandalismo, valendo-se do anonimato. O direito desses últimos não pode prevalecer sobre o interesse coletivo de manter incólume a ordem pública.

O que parece ser inadmissível é a perspectiva de se impor ao Poder Público que assista inerte à prática de atos de vandalismo, ou mesmo que venha atuar apenas repressivamente, quando o dano se concretiza, com resultados ultrapassam os agentes diretamente envolvidos e atingem a vida, a integridade física ou o patrimônio de terceiros.
Postado por Gabriela López /http://sargentoricardo.blogspot.com.br/

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