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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012


A expressão “entulho autoritário” surgiu no fim da ditadura, quando se pretendia denunciar e eliminar heranças do regime militar que sobreviveram à mudança de regime. Hoje em dia, convive-se com vários “entulhos autoritários” e tem gente que até acha bom.
A Lei de Anistia, por exemplo, é um entulho autoritário. Foi criada pelo general João Figueiredo, quando o país era uma ditadura e o parlamento era corretamente definido como “Congresso fantoche.” Mas há quem acredite que ela serve para manter o pacto democrático em que vivemos e não aceita a idéia de rever a interpretação de que ela assegurou anistia prévia aos torturadores.
Outro entulho autoritário é a Polícia Militar. A PM foi criada em 1970, como um braço auxiliar do Exército para reprimir e controlar a população civil. Já existia, é verdade, a Força Pública. Mas se queria uma corporação mais dura, mais bruta, sob controle direto dos generais do Exército, instituição que realmente governava o país no momento. Foi assim que nasceu a PM.
Ela possui serviço de inteligência, como o Exército. Infiltra agentes a paisana em movimentos civis — o que é absurdo. Tem disciplina, formação política, orientação ideológica — como o Exército. E é intocável — como o Exército.

Uma das estrelas da insignia da PM refere-se ao golpe de 64.

A greve da PM na Bahia com todo seu festival de violência e desafios às autoridade é inaceitável. A tragédia ficou clara não só na ocorrência de homicídios, mas no ambiente de desafio à ordem democrática. Greve de categoria armada é motim.
Embora muito mais grave, com risco de repetir-se em vários Estados, esta paralisação é mais um episódio a mais, que demonstra as dificuldades da instituição em conviver com o regime democrático e dar um tratamento à altura à população que deveria proteger.
A pancadaria na periferia já é um dado banal e permanente da população pobre. E se parecia elitismo querer a PM fora da USP, a pancadaria em cima de um estudante que recusou-se a mostrar a carteirinha de aluno numa situação em que isso era claramente uma forma de discriminação obriga a uma segunda reflexão a respeito.
A PM porta-se como uma instituição soberana, que não presta contas a ninguém. Apesar do nome, não tem vocação para trabalho de polícia. Atua como tropa de ocupação, um exercito em terra estrangeira. Essa era sua doutrina, no passado. Mudou?
É incontrolável. Tanto que, em São Paulo, de vez em quando os governadores falam em “soltar” a Rota, numa expressão que dispensa comentários. Muitos governadores preferem soltar a PM sobre a população porque isso dá Ibope. O saldo está aí, à vista de todos.
Seria um erro imaginar que a PM não é capaz de fazer um bom trabalho, quando é mantida sob disciplina e bem orientada. O Brasil precisa de policia, sim. E ela deve usar a violencia, quando for necessário.
O fenômeno das UPPs, no Rio de Janeiro, seria impensável sem a PM. Mas as milicias, que atuam no mesmo Estado, também são parte da PM.
Essa situação mostra que está na hora de remover o entulho autoritário. A PM, como tropa de ocupação, não dá. Uma democracia nunca será protegida por uma instituição construída para proteger uma ditadura. A PM precisa de uma reforma ampla, geral e quase irrestrita.
 
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