Estudo do Ipea sobre mobilidade urbana alerta para negligência na gestão do transporte público e na política equivocada que aumenta frota de carros e motos
Caminhões na Marginal Pinheiros, na altura da Cidade Universitária (AE)
De 1977 a 2005, nas grandes regiões metropolitanas, houve uma queda de 68% para 51% do total de viagens motorizadas feitas por transporte público. O uso de automóvel também aumentou de 32% para 49%
As políticas de mobilidade urbana não estão sendo suficientes para conter a degradação do trânsito. Esta é uma das conclusões da pesquisa A mobilidade urbana no Brasil, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgada nesta quarta-feira. O trabalho aponta as deficiências do transporte público no país e a persistência do estímulo ao uso de automóveis e motocicletas – na contramão do que fazem no momento os países desenvolvidos.
De acordo com o levantamento, as políticas de estímulo ao uso do transporte individual associadas ao encarecimento da locomoção pública agravam os problemas no trânsito. O resultado desse processo é o que os moradores das cidades brasileiras experimentam no cotidiano: aumento nos congestionamento, mais poluição e acidentes.
A dificuldade no deslocamento reforça ainda, segundo a pesquisa, a exclusão social dos que não têm condições de comprar um veículo e só podem, portanto, se locomover através do transporte público, que fica cada vez mais caro e com a qualidade se deteriorando.
Os dados apresentados pelo Ipea mostram que são exatamente as pessoas de média e baixa renda os usuários do transporte público que acabam pagando os custos dos benefícios tarifários concedidos no país, que chegam a 60%. “Como a gratuidade é uma política de proteção social a segmentos desfavorecidos, o certo é que toda a sociedade arque com esse custo, evitando que o maior ônus recaia sobre os segmentos de menor poder aquisitivo”, adverte a pesquisa.
A saída encontrada pelos passageiros com algum poder aquisitivo é a aquisição de seu próprio veículo. Em 2008, foram vendidos no país cerca de 2,2 milhões de automóveis e 1,9 milhão de motos. A comercialização de motocicleta cresce a uma taxa de 20% ao ano, sustentada, sobretudo, pelos modelos mais populares, pagos através de financiamentos que se aproximam do gasto mensal com passagens. Entre 1996 e 2006, as novas 7,6 milhões de motos estiveram envolvidas em oito mil mortes no trânsito. Em 2007, os motociclistas se envolveram em 22% das mortes desse tipo.
Segundo o levantamento do Ipea, a maior quantidade de automóveis e motos nas ruas está ligada ao aumento do poder de consumo, às deficiências do transporte público e às isenções de impostos e facilidades financeiras para a compra de veículos particulares. A projeção é de que a frota desses dois tipos de veículos dobre até 2025.
O aumento no número de veículos particulares tem impacto direto no tempo gasto para se locomover. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios mostra que, entre 1992 e 2008, o tempo médio para fazer o trajeto entre a casa e o trabalho nas dez principais regiões metropolitanas do Brasil cresceu em 6%. Os que gastam mais de uma hora nesse caminho subiram de 15,7% para cerca de 19%.
De 1977 a 2005, nas grandes regiões metropolitanas, houve uma queda de 68% para 51% do total de viagens motorizadas feitas por transporte público. O uso de automóvel também aumentou de 32% para 49%. Nas cidades com mais de 60 mil habitantes, em 2007, a frota era de 20 milhões de veículos, sendo que os automóveis e veículos comerciais leves correspondiam a 75,2%. Dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) mostram que o transporte privado emite 15 vezes mais poluentes locais e quase duas vezes mais CO2 do que o transporte público.
Transporte público de mal a pior – A solução, que seria o transporte público, parece ainda distante. Os sistemas de trem e metrô existem em apenas 13 regiões metropolitanas e respondem a um baixo percentual de viagens. Apenas Rio de Janeiro e São Paulo apresentam um esquema metro-ferroviário com maior participação na locomoção. Outro problema detectado pela pesquisa é a pouca integração dos órgãos ligados aos transportes. Cada um cuida do planejamento de sua competência e acaba por causar níveis de serviços diferenciados, como superposição de linhas, preços desiguais, falta de integração física e tecnológica e tarifária.
A pesquisa conclui que, enquanto houver incentivos do governo federal, seja através de IPI reduzido para a compra de veículos, seja pela facilidade de encontrar estacionamento gratuito nas vias públicas ou por causa do baixo preço do licenciamento e do IPVA, a frota de carros e motos vai continuar a crescer. Se mantidas as tendências atuais, com as pouquíssimas políticas de incentivo ao transporte público, a estimativa é de que o trânsito ficará ainda mais caótico nas regiões metropolitanas. “Isto mostra que o mercado futuro do transporte público não é promissor, a não ser que políticas muito favoráveis a ele – incluindo restrições ao uso do automóvel – sejam implantadas”, diz a pesquisa.
Fonte: Veja/http://sargentoricardo.blogspot.com/
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