PM representa contra delegado por não fazer flagrante do jeito que ele queria
JURÍDICO
Com relação ao ofício assinado pelo policial militar JOSÉ PASCOAL NICULETTI informando que JOSÉ CARLOS DOS SANTOS foi surpreendido conduzindo seu veículo alcoolizado, depois foi submetido ao teste do etilômetro que apresentou o resultado de 0,99 graus de álcool por litro de sangue. Consta na reclamação do miliciano que a ocorrência foi apresentada e não compareci para efetuar o Auto de Prisão em Flagrante Delito em desfavor do imputado.
Informo que perfilo o entendimento no sentido de que a prisão em flagrante delito embasada unicamente no etilômetro é uma ilegalidade e que todos os Delegados de Polícia de Santa Fé do Sul e das cidades circunvizinhas possuem análogo entendimento jurídico.
Antes de qualquer explicação cabe destacar também que a materialidade do crime em análise foi preservada, pois na ocasião o imputado concordou em se submeter ao exame de sangue visando constatar o seu estado de embriaguez, conforme consta no Boletim de Ocorrência 294/2010 desta Unidade de Polícia Judiciária.
Apesar da falta de amparo fático e jurídico dos milicianos descontentes com a decisão dessa Autoridade Policial é mister que se considere a natureza do Auto de Prisão em Flagrante Delito que é uma das formas de ter início o procedimento investigativo, nas hipóteses em que a materialidade e a autoria forem inarredáveis, assim como, quando estiverem presentes, de forma segura, os elementos caracterizadores da flagrância. A prisão em flagrante, ainda que afiançável, fere o “status libertatis” do cidadão, razão pela qual apenas pode ser reservada para situações que não existam resquício de dúvidas. Foi conferido o poder discricionário à Autoridade Policial que pode ser utilizado, inclusive no momento em que decidir pela instauração de um procedimento investigatório (flagrante ou portaria), principalmente se lhe faltar segurança quanto à primeira medida. No caso em testilha o competente inquérito policial foi instaurado. Os milicianos, considerados agentes da autoridade policial, não deveriam se esquecer que no momento em que os fatos ocorreram a constrição da liberdade era uma prerrogativa do Delegado de Polícia, com fulcro nas normas constitucionais e infraconstitucionais.
Nesse sentido há uma brilhante decisão proferida pelo juiz de direito da Comarca de Rio Claro, Julio Osmany Barbin, em um caso semelhante em que o policial militar também se manifestou descontente pela não lavratura de auto de prisão em flagrante. Conforme a decisão:
“A Polícia Militar não é órgão censor da Polícia Civil e a recíproca é verdadeira [...] autoridade policial, por excelência e na forma de nossa estrutura legal, que suporta a organização da Secretaria de Segurança Pública, é o DELEGADO DE POLÍCIA. A ele incumbe, mercê de sua formação jurídica e por exigência de requisitos para o ingresso na carreira policial, apreciar as infrações penais postas por seus agentes (policiais, genericamente entendidos), sob a luz do Direito, máxime, em se cuidando de Segurança Pública, do DIREITO PENAL. Sempre que tiver conhecimento de uma infração penal o Delegado de Polícia (autoridade policial por excelência) deve fazer uma avaliação, a fim de visualizar se se cuida fato típico, como espelha a Teoria da Tipicidade, o “TATBESTAND” do Direito Alemão, ou não, daí procedendo de acordo com o que a lei regrar.
Do mesmo modo, concluído que se cuida de “fato típico”, incumbe ao Delegado de Polícia, por via da formulação de um juízo de valor, decidir se se trata de prisão em flagrante, em quase-flagrante (flagrante próprio e impróprio), flagrante preparado, ou, se, efetivamente, não houve flagrante. A formulação desse juízo de valor não tem regra matemática a ser seguida. Cuida-se de uma avaliação subjetiva, realizada com os supedâneos do conhecimento jurídico e da experiência, amealhada ao longo da carreira policial. É conhecimento personalíssimo e ao abrigo de qualquer influência externa.
Corolário do exposto não é falho afirmar-se que entregue o fato à Autoridade Policial, por qualquer agente de sua autoridade, aquela primeira etapa do procedimento administrativo policial está exaurida.
E se é cômodo afirmar que “o caso foi levado ao conhecimento da autoridade policial” mais cômodo, ainda deve ser, após, não se fazerem ingerências no âmbito de outras atribuições, como a respeito verberaram todos os Meritíssimos Juizes de Direito e Promotores de Justiça que atuaram neste procedimento (fls. 15 a 22 e 24 a 35), cujos argumentos encampo para subsídios de minhas conclusões.
Entendo, com o abono das manifestações expendidas nestes autos, pelos meus colegas, que a presente representação só teria sentido se atribuído fosse fato criminoso à autoridade policial, o que, me parece, efetivamente, não houve, e nem foi propósito tal desta representação ao Juiz de Direito, Corregedor da Polícia Judiciária da Comarca de Rio Claro.
Repito, para bem cumprir sua missão é dever do Delegado de Polícia proceder a uma formalização, mesmo que precária de tipicidade, pois a definitiva incumbe ao Ministério Público, do fato criminoso a si colocado, para daquela tipicidade precária tirar efeitos jurídico-processuais, bem assim decidir se é infração da qual o agente se livra solto, mediante fiança, ou sem direito a fiança (inafiançável), ou se se cuida de crime hediondo ou qualquer outro, para pedir a segregação temporária do indiciado se julgar necessário, caso não opte pela flagrância do delito.
Todo esse complexo desenrolar subjetivo está afeto ao Delegado de Polícia, em cuja atividade funcional está a salvo de qualquer interferência, mesmo do Ministério Público, órgão de fiscalização externa da Polícia Civil (C.F./88 e L.O.M.P.), caso não haja, na espécie, a prática de ilícito (advocacia administrativa, favorecimento pessoal, corrupção etc.) de parte da autoridade policial atuante.
Para completar o raciocínio aqui desenvolvido é oportuno colocar que na estrutura da Secretaria de Segurança Pública, as autoridades administrativas hierarquizadas são o Governador do Estado, seu Secretário da Segurança Pública e o Delegado de Polícia Judiciária.
Todos os demais integrantes dessa complexa estrutura são “agentes da autoridade policial” que os doutos chamam de “longa manus”, em substituição ao particípio presente do verbo agir para tal fim substantivado.
Assim, são agentes da autoridade policial judiciária, que é o Delegado de Polícia, toda a Polícia Militar, desde seu Comandante Geral até o mais novo praça e todo o segmento da organização Polícia Civil, bem assim o I.M.L., I.P.T etc… e nenhuma dessas categorias podendo influenciar os atos da autoridade policial, enquanto “atos de polícia judiciária” sujeitos a avaliação jurídico-subjetiva. Ademais, se o ilícito foi apurado via “persecutio criminis” pela instauração de inquérito policial, iniciado por portaria e não por ato de prisão em flagrante, essa situação não retira, jamais, a nobreza do ato do policial militar que, despojando-se da própria vida cumpre o seu altruístico dever de defender a sociedade, aliás o que a gloriosa Polícia Militar do Estado de São Paulo, tão bem sabe fazer.” (Autos nº 253/2002 - Correg)
A Lei 11.705/08 que diminuiu a tolerância à ingestão de álcool, bem como criou punições mais severas para os que incidirem nas suas normas proporcionou a discussão sobre a problemática do consumo de bebidas alcoólicas por motoristas e de acordo com a maioria dos doutrinadores alguns dos seus artigos ferem a legislação em vigor, inclusive a Constituição Federal.
Outro ponto que merece ser ressaltado diz respeito ao fato do artigo 276 do Código de Trânsito prever que qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidade previstas no artigo 165 do Código de Trânsito e o artigo 306 dispor que comete o crime de dirigir embriagado aquele que conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.
É importante considerar que ambas as normas utilizam o termo “concentração de álcool por litro de sangue” e o parágrafo único desse artigo 306 dispõe que o Poder Executivo Federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime.
A referida estipulação ocorreu por intermédio do Decreto 6.488/08 oriundo do Poder Executivo que prevê a utilização do etilômetro para constatar a embriaguez do condutor do veículo.
Esse Decreto fere frontalmente o artigo 22, I da Constituição Federal que prevê que compete privativamente à União legislar sobre direito penal, ou seja, apenas o Legislativo pode emitir normas de cunho penal e não o Executivo, como prevê o entendimento dos milicianos.
Assim, em que pese a previsão contida no referido Decreto, a mesma é inconstitucional e ilegal, pois não é admissível que uma Lei – sob o aspecto jurídico-formal - que define como crime, exprimir tipo (penal), e tal tipo (penal) ser alterado por Decreto.
Desta forma, percebe-se que o Código de Trânsito exige a concentração de álcool no sangue para que haja o crime e não dispõe sobre a concentração da referida substância no ar expelido pelos pulmões. O Decreto ampliou os efeitos dessa Lei Penal, ou seja, aumentou o número de condutas consideradas criminosas, afrontando dessa forma o próprio Código de Trânsito, bem como a Constituição Federal.
Pelos motivos retro expostos entendo que as prisões em flagrante delito baseadas na utilização de etilômetro são nulas de pleno direito.
A aceitação do etilômetro para constatar esse tipo de crime representa uma alteração no tipo penal sem qualquer aprovação legislativa e por isso fere o equilíbrio do ordenamento jurídico pátrio e promove a instabilidade jurídica, características presentes em regimes autoritários, como no período da Ditadura Militar.
Não há lei que determine ou que torne crime a dosagem alcoólica baseada no ar expelido, pois a previsão do Código de Trânsito é taxativa ao definir como tipo penal a concentração de álcool no sangue.
Essa previsão penal não pode ser considerada uma norma penal em branco, portanto prescinde de complementação por qualquer ato legal ou infralegal. Deve-se respeitar o princípio da reserva legal, cujo seu conteúdo jurídico é a taxatividade.
Outro ponto que merece ser apresentado diz respeito ao fato da lei em comento não ter alterado qualquer disposição relativa às perícias em geral preconizadas pelo nosso Código de Processo Penal, de modo que havendo vestígios, é indispensável a realização de "exame" de corpo de delito com o fito de demonstrar a materialidade do fato em observância à inafastável regra do artigo 158 e seguintes do referido Código.
O aparelho etilômetro afere a quantidade de álcool no ar expelido pelo pulmão e o "documento" emitido pelo seu "teste" sequer menciona esta circunstância, pois só exame no tecido sanguíneo pode provar. O teste promovido pelo aparelho, nem de longe pode ser considerado perícia, pois, além de não viabilizar contraprova, conforme preceitua nosso sistema probatório, o seu operador, não possui a qualificação técnico-científica exigida pela lei para a realização de perícias, dado que por vezes, os agentes não possuem nível superior. O próprio termo alcoolemia, no léxico, significa: "estado do sangue que contém álcool".
Entendimento semelhante é sustentado pelos cultores do direito Guilherme de Souza Nucci, Hélio Molina Jorge, Ademir Gasques Sanches, Giuliano Sorge de Paula Silva, Haroldo Ferreira, Cristiano de Oliveira Mello, Maurício José Mendes Resende, Marcelo da Silva Zompero, Fernando Capez, Og Fernandes, Gustavo Junqueira, Frederico Costa Miguel, José Carlos Chedid, Ericson Abufares, Fernando José Góes, Alberto Lopes Filho, Adilson Batanero, Alexandre Bento, Miguel Gomes da Rocha Neto, Edson Maldonado, José Crisci Manzano e Giuliano Travain.
Pelo exposto, cabe destacar aos milicianos insatisfeitos com a decisão desta Autoridade Policial signatária que no Estado Democrático de Direito nos submetemos ao texto da Lei e a constrição da liberdade decorre da vontade do legislador e não dos agentes que tentam aplicar a Lei ao seu bel prazer.
Aproveito para encaminhar em anexo decisões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do Fórum Regional de Pinheiros, do Poder Judiciário de Goiás e do Rio de Janeiro, bem como artigos doutrinários e reportagens que consideram ilegal a utilização do etilômetro para aferir o consumo de álcool pelo condutor do veículo.
Higor Jorge
DELEGADOS.com.br
Revista da Defesa Social
Portal Nacional dos Delegados
Fonte: http://www.delegados.com.br/juridico/pm-representa-contra-delegado-por-nao-fazer-flagrante-do-jeito-que-ele-queria.htm
JURÍDICO
Com relação ao ofício assinado pelo policial militar JOSÉ PASCOAL NICULETTI informando que JOSÉ CARLOS DOS SANTOS foi surpreendido conduzindo seu veículo alcoolizado, depois foi submetido ao teste do etilômetro que apresentou o resultado de 0,99 graus de álcool por litro de sangue. Consta na reclamação do miliciano que a ocorrência foi apresentada e não compareci para efetuar o Auto de Prisão em Flagrante Delito em desfavor do imputado.
Informo que perfilo o entendimento no sentido de que a prisão em flagrante delito embasada unicamente no etilômetro é uma ilegalidade e que todos os Delegados de Polícia de Santa Fé do Sul e das cidades circunvizinhas possuem análogo entendimento jurídico.
Antes de qualquer explicação cabe destacar também que a materialidade do crime em análise foi preservada, pois na ocasião o imputado concordou em se submeter ao exame de sangue visando constatar o seu estado de embriaguez, conforme consta no Boletim de Ocorrência 294/2010 desta Unidade de Polícia Judiciária.
Apesar da falta de amparo fático e jurídico dos milicianos descontentes com a decisão dessa Autoridade Policial é mister que se considere a natureza do Auto de Prisão em Flagrante Delito que é uma das formas de ter início o procedimento investigativo, nas hipóteses em que a materialidade e a autoria forem inarredáveis, assim como, quando estiverem presentes, de forma segura, os elementos caracterizadores da flagrância. A prisão em flagrante, ainda que afiançável, fere o “status libertatis” do cidadão, razão pela qual apenas pode ser reservada para situações que não existam resquício de dúvidas. Foi conferido o poder discricionário à Autoridade Policial que pode ser utilizado, inclusive no momento em que decidir pela instauração de um procedimento investigatório (flagrante ou portaria), principalmente se lhe faltar segurança quanto à primeira medida. No caso em testilha o competente inquérito policial foi instaurado. Os milicianos, considerados agentes da autoridade policial, não deveriam se esquecer que no momento em que os fatos ocorreram a constrição da liberdade era uma prerrogativa do Delegado de Polícia, com fulcro nas normas constitucionais e infraconstitucionais.
Nesse sentido há uma brilhante decisão proferida pelo juiz de direito da Comarca de Rio Claro, Julio Osmany Barbin, em um caso semelhante em que o policial militar também se manifestou descontente pela não lavratura de auto de prisão em flagrante. Conforme a decisão:
“A Polícia Militar não é órgão censor da Polícia Civil e a recíproca é verdadeira [...] autoridade policial, por excelência e na forma de nossa estrutura legal, que suporta a organização da Secretaria de Segurança Pública, é o DELEGADO DE POLÍCIA. A ele incumbe, mercê de sua formação jurídica e por exigência de requisitos para o ingresso na carreira policial, apreciar as infrações penais postas por seus agentes (policiais, genericamente entendidos), sob a luz do Direito, máxime, em se cuidando de Segurança Pública, do DIREITO PENAL. Sempre que tiver conhecimento de uma infração penal o Delegado de Polícia (autoridade policial por excelência) deve fazer uma avaliação, a fim de visualizar se se cuida fato típico, como espelha a Teoria da Tipicidade, o “TATBESTAND” do Direito Alemão, ou não, daí procedendo de acordo com o que a lei regrar.
Do mesmo modo, concluído que se cuida de “fato típico”, incumbe ao Delegado de Polícia, por via da formulação de um juízo de valor, decidir se se trata de prisão em flagrante, em quase-flagrante (flagrante próprio e impróprio), flagrante preparado, ou, se, efetivamente, não houve flagrante. A formulação desse juízo de valor não tem regra matemática a ser seguida. Cuida-se de uma avaliação subjetiva, realizada com os supedâneos do conhecimento jurídico e da experiência, amealhada ao longo da carreira policial. É conhecimento personalíssimo e ao abrigo de qualquer influência externa.
Corolário do exposto não é falho afirmar-se que entregue o fato à Autoridade Policial, por qualquer agente de sua autoridade, aquela primeira etapa do procedimento administrativo policial está exaurida.
E se é cômodo afirmar que “o caso foi levado ao conhecimento da autoridade policial” mais cômodo, ainda deve ser, após, não se fazerem ingerências no âmbito de outras atribuições, como a respeito verberaram todos os Meritíssimos Juizes de Direito e Promotores de Justiça que atuaram neste procedimento (fls. 15 a 22 e 24 a 35), cujos argumentos encampo para subsídios de minhas conclusões.
Entendo, com o abono das manifestações expendidas nestes autos, pelos meus colegas, que a presente representação só teria sentido se atribuído fosse fato criminoso à autoridade policial, o que, me parece, efetivamente, não houve, e nem foi propósito tal desta representação ao Juiz de Direito, Corregedor da Polícia Judiciária da Comarca de Rio Claro.
Repito, para bem cumprir sua missão é dever do Delegado de Polícia proceder a uma formalização, mesmo que precária de tipicidade, pois a definitiva incumbe ao Ministério Público, do fato criminoso a si colocado, para daquela tipicidade precária tirar efeitos jurídico-processuais, bem assim decidir se é infração da qual o agente se livra solto, mediante fiança, ou sem direito a fiança (inafiançável), ou se se cuida de crime hediondo ou qualquer outro, para pedir a segregação temporária do indiciado se julgar necessário, caso não opte pela flagrância do delito.
Todo esse complexo desenrolar subjetivo está afeto ao Delegado de Polícia, em cuja atividade funcional está a salvo de qualquer interferência, mesmo do Ministério Público, órgão de fiscalização externa da Polícia Civil (C.F./88 e L.O.M.P.), caso não haja, na espécie, a prática de ilícito (advocacia administrativa, favorecimento pessoal, corrupção etc.) de parte da autoridade policial atuante.
Para completar o raciocínio aqui desenvolvido é oportuno colocar que na estrutura da Secretaria de Segurança Pública, as autoridades administrativas hierarquizadas são o Governador do Estado, seu Secretário da Segurança Pública e o Delegado de Polícia Judiciária.
Todos os demais integrantes dessa complexa estrutura são “agentes da autoridade policial” que os doutos chamam de “longa manus”, em substituição ao particípio presente do verbo agir para tal fim substantivado.
Assim, são agentes da autoridade policial judiciária, que é o Delegado de Polícia, toda a Polícia Militar, desde seu Comandante Geral até o mais novo praça e todo o segmento da organização Polícia Civil, bem assim o I.M.L., I.P.T etc… e nenhuma dessas categorias podendo influenciar os atos da autoridade policial, enquanto “atos de polícia judiciária” sujeitos a avaliação jurídico-subjetiva. Ademais, se o ilícito foi apurado via “persecutio criminis” pela instauração de inquérito policial, iniciado por portaria e não por ato de prisão em flagrante, essa situação não retira, jamais, a nobreza do ato do policial militar que, despojando-se da própria vida cumpre o seu altruístico dever de defender a sociedade, aliás o que a gloriosa Polícia Militar do Estado de São Paulo, tão bem sabe fazer.” (Autos nº 253/2002 - Correg)
A Lei 11.705/08 que diminuiu a tolerância à ingestão de álcool, bem como criou punições mais severas para os que incidirem nas suas normas proporcionou a discussão sobre a problemática do consumo de bebidas alcoólicas por motoristas e de acordo com a maioria dos doutrinadores alguns dos seus artigos ferem a legislação em vigor, inclusive a Constituição Federal.
Outro ponto que merece ser ressaltado diz respeito ao fato do artigo 276 do Código de Trânsito prever que qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidade previstas no artigo 165 do Código de Trânsito e o artigo 306 dispor que comete o crime de dirigir embriagado aquele que conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.
É importante considerar que ambas as normas utilizam o termo “concentração de álcool por litro de sangue” e o parágrafo único desse artigo 306 dispõe que o Poder Executivo Federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime.
A referida estipulação ocorreu por intermédio do Decreto 6.488/08 oriundo do Poder Executivo que prevê a utilização do etilômetro para constatar a embriaguez do condutor do veículo.
Esse Decreto fere frontalmente o artigo 22, I da Constituição Federal que prevê que compete privativamente à União legislar sobre direito penal, ou seja, apenas o Legislativo pode emitir normas de cunho penal e não o Executivo, como prevê o entendimento dos milicianos.
Assim, em que pese a previsão contida no referido Decreto, a mesma é inconstitucional e ilegal, pois não é admissível que uma Lei – sob o aspecto jurídico-formal - que define como crime, exprimir tipo (penal), e tal tipo (penal) ser alterado por Decreto.
Desta forma, percebe-se que o Código de Trânsito exige a concentração de álcool no sangue para que haja o crime e não dispõe sobre a concentração da referida substância no ar expelido pelos pulmões. O Decreto ampliou os efeitos dessa Lei Penal, ou seja, aumentou o número de condutas consideradas criminosas, afrontando dessa forma o próprio Código de Trânsito, bem como a Constituição Federal.
Pelos motivos retro expostos entendo que as prisões em flagrante delito baseadas na utilização de etilômetro são nulas de pleno direito.
A aceitação do etilômetro para constatar esse tipo de crime representa uma alteração no tipo penal sem qualquer aprovação legislativa e por isso fere o equilíbrio do ordenamento jurídico pátrio e promove a instabilidade jurídica, características presentes em regimes autoritários, como no período da Ditadura Militar.
Não há lei que determine ou que torne crime a dosagem alcoólica baseada no ar expelido, pois a previsão do Código de Trânsito é taxativa ao definir como tipo penal a concentração de álcool no sangue.
Essa previsão penal não pode ser considerada uma norma penal em branco, portanto prescinde de complementação por qualquer ato legal ou infralegal. Deve-se respeitar o princípio da reserva legal, cujo seu conteúdo jurídico é a taxatividade.
Outro ponto que merece ser apresentado diz respeito ao fato da lei em comento não ter alterado qualquer disposição relativa às perícias em geral preconizadas pelo nosso Código de Processo Penal, de modo que havendo vestígios, é indispensável a realização de "exame" de corpo de delito com o fito de demonstrar a materialidade do fato em observância à inafastável regra do artigo 158 e seguintes do referido Código.
O aparelho etilômetro afere a quantidade de álcool no ar expelido pelo pulmão e o "documento" emitido pelo seu "teste" sequer menciona esta circunstância, pois só exame no tecido sanguíneo pode provar. O teste promovido pelo aparelho, nem de longe pode ser considerado perícia, pois, além de não viabilizar contraprova, conforme preceitua nosso sistema probatório, o seu operador, não possui a qualificação técnico-científica exigida pela lei para a realização de perícias, dado que por vezes, os agentes não possuem nível superior. O próprio termo alcoolemia, no léxico, significa: "estado do sangue que contém álcool".
Entendimento semelhante é sustentado pelos cultores do direito Guilherme de Souza Nucci, Hélio Molina Jorge, Ademir Gasques Sanches, Giuliano Sorge de Paula Silva, Haroldo Ferreira, Cristiano de Oliveira Mello, Maurício José Mendes Resende, Marcelo da Silva Zompero, Fernando Capez, Og Fernandes, Gustavo Junqueira, Frederico Costa Miguel, José Carlos Chedid, Ericson Abufares, Fernando José Góes, Alberto Lopes Filho, Adilson Batanero, Alexandre Bento, Miguel Gomes da Rocha Neto, Edson Maldonado, José Crisci Manzano e Giuliano Travain.
Pelo exposto, cabe destacar aos milicianos insatisfeitos com a decisão desta Autoridade Policial signatária que no Estado Democrático de Direito nos submetemos ao texto da Lei e a constrição da liberdade decorre da vontade do legislador e não dos agentes que tentam aplicar a Lei ao seu bel prazer.
Aproveito para encaminhar em anexo decisões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do Fórum Regional de Pinheiros, do Poder Judiciário de Goiás e do Rio de Janeiro, bem como artigos doutrinários e reportagens que consideram ilegal a utilização do etilômetro para aferir o consumo de álcool pelo condutor do veículo.
Higor Jorge
DELEGADOS.com.br
Revista da Defesa Social
Portal Nacional dos Delegados
Fonte: http://www.delegados.com.br/juridico/pm-representa-contra-delegado-por-nao-fazer-flagrante-do-jeito-que-ele-queria.htm
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