18.06.2014 | 05:10
ARENA JURÍDICA, POLÍCIA FEDERAL
O
Brasil adotou um complicado sistema de segurança pública e hoje a
sociedade paga esse prejuízo: a ineficiência das policias e a impunidade
decorrente da má conjunção entre Polícias, Ministério Público e Poder
Judiciário conjugados com uma legislação permissiva.
A
metodologia investigativa adotada em nosso país é anacrônica e
cartorialista. Tem como base o excesso de burocracia, com a exigência de
um sem número de formalidades. O que deveria ser o objetivo de todo
policial e, por consequência, das investigações – resolver o crime,
indícios de autoria e materialidade – torna-se secundário. Número
elevado de policiais são deslocados para suprir o excesso de burocracia.
Fabricar papel. ?
Em
todos os países em que o direito à segurança pública é bem prestado
pelo governo temos, inevitavelmente, a aproximação do titular da ação
penal (no Brasil, o Ministério Público) com os “produtores das provas”,
os investigadores (na Polícia Federal, os agentes, escrivães,
papiloscopistas e peritos). Daí surgiu a necessidade de diálogos e
reuniões que tratam do tema segurança pública, buscando alternativas
para sua melhoria. Para a prestação do serviço público de forma
minimamente eficiente, ampla e afirmativa.
Os
frutos desse intenso trabalho começam a surgir. Basta pequena busca nos
pleitos em andamento no legislativo. Enquanto os representantes dos
agentes e dos promotores buscam alternativas e soluções para a crescente
impunidade e falta de segurança: (Propostas de Emendas à Constituição
(PEC) 51/13 -cria o ciclo completo de polícia, desmilitarização,
carreira única, corregedoria externa; PECs 361/13 e 73/13 – estabelecem a
meritocracia na Polícia Federal, por meio do ingresso único; PL 7402/14
– moderniza a investigação criminal e aproxima o MP dos policiais
durante a investigação). As representações dos delegados buscam regalias
e prerrogativas (PEC 549/06 – equipara o salário do delegado ao do MP;
PEC 37/11 – apelidada de PEC da impunidade, proíbe o MP de investigar;
PL 7193/10 – estabelece autonomia e livre convencimento ao delegado; PLS
124/2011 – autonomia, inamovibilidade, carreira jurídica e pronome de
tratamento “excelência” para delegados). Será que vivemos em países
distintos?
Em
2012, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) editou um estudo
denominado “Diagnóstico da Investigação de Homicídios no Brasil” que
constatou: apenas 5% a 8% dos inquéritos abertos para determinar a
autoria de crimes contra a vida no país resultam em denúncia (média
nacional). Ou seja, mais de 92% dos assassinos ficam impunes.
Para
fins comparativos, apresentamos a taxa de homicídios de vários países
em 2010. A ONU considera de violência endêmica os países com índices
superiores a 10 homicídios por 100 mil habitantes: Brasil, 22,4; Egito
2,3; Canadá, 1,4; EUA, 4,7; Bolivia 8,0; Chile, 3,2; Paraguai 11,4;
Japão, 0,4; Paquistão, 7,6; Israel, 2,0; Portugal, 1,2; Alemanha, 0,8.
A
crise da Polícia Federal é a mesma vivida por toda a segurança pública
brasileira. Prestação de serviço que vem se demonstrando falho. Temos
menos de 4% de eficiência nas investigações da PF, conforme pesquisa
recente do CNMP. Precisaremos entrar em colapso para discutir e debater
segurança pública de forma séria? Ou vamos continuar lançando cortinas
de fumaça, operações midiáticas e, em pouco tempo, todos estarão soltos e
se locupletando dos crimes cometidos.
Recente
pesquisa demonstrou que menos de 5% dos policiais federais vêm na
figura do delegado federal um progresso na carreira. A burocracia, a
inexperiência e a possibilidade de o crime organizado infiltrar pessoas
formadas em Direito na Polícia Federal, já tomando posse e assumindo a
presidência de inquéritos, são itens de extrema relevância para que se
estabeleça uma porta única de entrada na corporação.
A
população e os verdadeiros policiais querem mudanças, querem e devem
ser informados. Mas acima disso está a necessidade de um combate efetivo
à corrupção, o fim da impunidade e uma lei que realmente tenha
aplicabilidade para todos e por todos.
E
isso começa pela construção de uma polícia democrática e cidadã. Esse
modelo já demonstrou sua falência e seus defensores não poderão fugir
das discussões em torno do que é melhor e possível para dar segurança
real ao cidadão brasileiro.
* Luis de Araújo Boudens é agente de Polícia Federal e vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais
Fonte: Blog do Estadão
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