Entre a pressão e a força, um Poder "sitiado"
Foto: Diego Nigro/JC Imagem
Por Bruna Serra, do Jornal do Commercio
“Precisamos pensar nas consequên-cias pessoais de ficar e nas
consequências morais de desocupar.” A frase de Cristiano Vasconcelos
ecoou no plenarinho da Câmara Municipal do Recife quando já passava das
duas da madrugada de ontem. Diante de quase 70 manifestantes, o
estudante da Universidade Católica estava mesmo disposto a convencer os
companheiros a ficar e resistir.
Mas a estratégia desenhada pelo governo estadual, tendo à frente o
secretário de Defesa Social, Wilson Damásio, de não permitir a entrada
de água e comida na casa de José Mariano, evidenciou as fraquezas da
primeira ocupação de poder público realizada na capital. Evidenciou,
também, a disposição do Estado em fazer valer a força policial.
Nas cadeiras, de um acolchoado cinza desgastado, alguns já haviam se
entregado ao sono quando a única rodada de negociação foi aberta, à
meia-noite e meia.
À cabeceira da mesa retangular, localizada no piso térreo, estava o
presidente do Legislativo municipal, Vicente André Gomes (PSB), irritado
porque seus telefonemas aos dois principais responsáveis pela
articulação política do governo Geraldo Julio (PSB) - Fred Oliveira e
Sileno Guedes - tinham como único destino a caixa de mensagens.
Vicente André Gomes estava sem poder diante dos policiais que faziam a
segurança da Casa – já que nem mesmo tinha autoridade para permitir a
entrada da imprensa – e vulnerável diante de jovens indóceis,
conhecedores do regimento interno e dispostos a fazer render a conversa
madrugada adentro.
“Nós sabemos que se a proposta vier do Executivo, entra em caráter de
urgência. Não aceitamos a tramitação do projeto passe livre em 60 dias”,
rebateu Pedro Josephi, um dos coordenadores da Frente de Luta
Transporte Público de Pernambuco.
Desconcertado, o presidente do Legislativo municipal afirmou que faria
valer o pedido de reintegração de posse já esboçado pelo procurador da
Casa, Izael Nóbrega, integrante da velha guarda socialista e principal
interlocutor do governador Eduardo Campos na noite da última
quinta-feira, a da ocupação.
Ficou evidente aos presentes, inclusive aos manifestantes, que àquela
altura, o governo utilizaria o Batalhão de Choque, posicionado em frente
à Câmara, na Rua do Hospício.
Janaína Oliveira ficou encarregada de levar ao grupo a proposta de
Vicente André Gomes, que se comprometeu a intermediar um contato dos
manifestantes com o governo e com a prefeitura, ainda que suas chamadas
seguissem sem resposta.
Também posicionou-se pela formação de uma comissão de vereadores para,
junto com a frente, iniciar um debate sobre o projeto passe livre e a
instalação da comissão parlamentar de inquérito para apurar os gastos
com transporte público no Estado. Ainda assim, repetia: “Mas a Justiça
vai barrar o projeto porque não podemos criar despesas ao Executivo”.
Os estudantes queriam mais. Continuam querendo. Cobram ser recebidos
pelo governador do Estado, principal voz no Consórcio Grande Recife
Transportes.
O clima da votação foi tenso. Vestida com uma camisa do PSTU, Janaína
fez uma lista de oradores e o debate começou. Desde a primeira fala, era
possível perceber a desmobilização da maioria, que, apesar de apertada,
fez valer a vontade de desocupar por 37 votos contra 32.
Suado em seu terno verde musgo com riscas de giz, o presidente da Casa
respirou aliviado. Folgou o colarinho da camisa enquanto os
manifestantes favoráveis à continuidade da ocupação tentavam nova
votação.
Na esperança de reverter o resultado, gastavam a voz em gritos no
plenarinho. A polícia já tinha partido, uma hora antes. O choque, não.
“Não é democrático querer nova votação porque o resultado não atende a
vontade de alguns”, gritava um manifestante. Assessores de olhos
inchados e avermelhados pareciam contar os minutos para que os
estudantes descessem as escadas da Casa de José Mariano, que assistiu,
na última quinta-feira, as alegrias e as dores da política como ela é.
Postado por Gabriela López / http://sargentoricardo.blogspot.com.br/
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